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Frank Carlucci, o santo americano

5 de Junho de 2018


Os media portugueses mostraram, uma vez mais, com a notícia da morte de Frank Carlucci, o baixo nível do jornalismo que praticam.
A simpatia ideológica ou a ignorância não justificam nem desculpam as omissões informativas que pervertem a aquisição do conhecimento necessário para entender a História. As notícias publicadas sobre Frank Carlucci não são apenas incompletas ou laudatórias: são uma traição clara do direito do público à informação. (JAG)

À luz dessas notícias, Frank Carlucci é apresentado como uma espécie de São Francisco americano enviado para salvar os portugueses do comunismo. Só um tonto ou um mal intencionado pode acreditar que havia, em 1974/75, a possibilidade de instauração de uma “ditadura comunista” em Portugal. Esse tópico da propaganda e contra-informação que pretendia justificar a onda terrorista lançada com a rede bombista de extrema direita [recomendo a leitura do bem documentado livro de Miguel Carvalho] escondia os verdadeiros motivos da estratégia delineada por Carlucci: travar e inverter as mudanças sociais e económicas que o PCP estava a implementar em Portugal. Designadamente, a reforma agrária e as nacionalizações.

Quem quiser estudar as reais condições políticas, militares e económicas que caracterizaram o chamado PREC tem à sua disposição abundante bibliografia. Sobre o caso particular de Carlucci, leia-se “Carlucci vs. Kissinger – Os EUA e a Revolução Portuguesa”, de Bernardino Gomes e Tiago Moreira de Sá.

Passemos, pois, ao franciscano embaixador.

Frank Carlucci fez a sua carreira no departamento de Estado como especialista da CIA em operações especiais. Ao contrário do que supõe um comentador de uma das televisões, não chegou à CIA só depois de ter sido embaixador em Lisboa.

O primeiro caso conhecido em que esteve envolvido foi o do assassínio do presidente do Congo, Patrice Lumumba, em 1961. Carlucci foi enviado para a embaixada no Congo com a missão expressa de cumprir a decisão de Eisenhower de eliminar Lumumba.

Outra intervenção qualificada de Carlucci ocorreu no Brasil, sob a batuta de Vernon Walters, em 1964/65, contra o governo de João Goulart. A acção conduzida pela CIA levou à instauração da violenta e criminosa ditadura militar.

A importância de Carlucci nas administrações dos EUA vai muito além da sua participação em operações especiais da CIA e dos serviços prestados nos departamentos de Estado e da Defesa. Esteve desde muito cedo ligado ao complexo militar-industrial, numa carreira recompensada pela Rand Corporation e pelo Grupo Carlyle.

João Alferes Gonçalves

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