Home » Zoom

Congressos, só de cuisine (César Príncipe)

26 de Novembro de 2020


E eis que Cazal-Ribeiro, aguerrido ex-deputado da Nação, supostamente finado, reapareceu, há dias, reincorporado no Hemiciclo. Esbracejou, enrubesceu, estrebuchou, acicatou as hostes, ameaçou o Governo. Haveria que deter o Congresso do PCP, mesmo que o conclave respeitasse a Constituição, cumprisse a Lei, garantisse a Ordem, acautelasse a Saúde Pública. Não é de agora a sanha dos Cazais. Como não há condições para ilegalizar o Partido, proíba-se o Congresso. Intento ciclópico. O malvado PCP resistiu ao Tarrafal, certamente resistirá ao Cazal. Assim foi com a Festa do Avante, realizada, com todas as regras e condicionalidades, contra os vaticínios mais funestos. Pelos vistos, o PCP é gato de sete fôlegos: atravessou a República de 5 Outubro, o Fascismo de 28 de Maio, a Democracia de 25 de Abril. E prepara-se para os 100 anos. Brevemente. Em 6 de Março de 2021. Com ou sem pandemias. Que as pandemias menos passageiras são as normalizadas: as da miséria, do desemprego, da incultura, do medo e da desesperança. Não dão tréguas. Nunca deram. Raramente deixam a Humanidade em paz.

Estamos em Novembro. Uma irmandade de filhos dilectos do salazarismo-marcelismo acaba de reconstruir e reanimar uma “Aliança Democrática”, proclamando a República de Rabo de Peixe, exercício para desembarque no Continente. Além deste desígnio programático, o Pacto do Rabo jura terminar com a subsídiodependência (não de banqueiros, eurofundistas e similares, não, não se trata de dar cabo de parasitas ricos, mas de alegados parasitas pobres, no caso, de crianças esfomeadas, famílias secularmente deserdadas, precocemente envelhecidas). Segundo o Pacto do Rabo, estas gentes precisam de ser despojadas do rendimento mínimo de inserção e obrigadas a trabalhar, a produzir, a poupar e a investir e reinvestir no Espírito Santo. Não no Divino do Arquipélago. Por(ventura) no Ex-DDT. Os empregos cairão dos céus. É a economia pós-moderna.

O Pacto do Rabo & a Campanha Anticongresso encontraram o generoso e habitual acolhimento do Sistema Mediático. Assentou-se a jurisprudência e concertou-se a agenda: não seria altura para o PCP se pôr a reflectir sobre problemáticas e dilemáticas internas e internacionais. Urge suspender a democracia quando o PCP levanta a voz, o punho e a cabeça. Às armas. O corona é quem mais ordena. Será oportuno relembrar: PSD e CDS (núcleo genético do rabismo de peixe) votaram contra a criação do Serviço Nacional de Saúde, estabelecido em 1979. São os que hoje tão irados se mostram com o Congresso do PCP, força que se associou ao PS para que milhões de portugueses desde há 40 anos usufruam deste avanço básico, humanista e civilizacional. Além do mais, estamos perante um surto demagógico e farisaico: cazalistas, rabistas e tele-opinantes não percepcionaram riscos sanitários no Congresso Nacional dos Cozinheiros, Taguspark/Oeiras (10-12 do mês corrente). Centenas de comensais portugueses e estrangeiros tiveram o privilégio de ouvir mais de 50 oradores. Gentilmente anunciado, o evento não aguçou a percepção viral dos Altos Magistrados da Contami(nação) nem sequer dos Rufias da Extrema-Direita. Os cazalistas não exprimiram qualquer reserva. Imperou o CBM/Consenso da Boa Mesa. Para os defensores da saúde como um ramo de negócio, o CBM é bem mais apetitoso do que o SNS.

Face à maldição do Congresso do PCP e à bênção do Congresso Nacional dos Cozinheiros, inclinar-nos-emos para uma tese maliciosa: a Batalha de Loures nada tem a ver com congressos, mas com as entidades que os organizam e com a doutrina que os movem e a história de classe que os inspira. O PCP até prescindiu de mesas e convidados. Em vão. De nada lhe valeu. Cometeu um erro de percepção: deveria ter promovido um congresso gastronómico: Eles comem tudo e não deixam nada. Mas não há organizações perfeitas. E não há cura para esta obsessão: sempre estiveram especial ou exclusivamente focados no PCP. Imaginem. Desde há um século. Focados.

Focados. Para recorrer ao Dicionário Futebolês, onde a pátria vai beber do fino.

César Príncipe – 24 novembro 2020

Imprima esta página Imprima esta página

Comente esta notícia.

Escreva o seu comentário, ou linque para a notícia do seu site. Pode também subscrever os comentários subscrever comentários via RSS.

Agradecemos que o seu comentário esteja em consonância com o tema. Os comentários serão filtrados, antes de serem aprovados, apenas para evitar problemas relacionados com SPAM.