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S.Miguel (Nuno Santa Clara)

18 de Agosto de 2020


Este Santo aparece em todas as regiões de Portugal, com igrejas e capelas da sua invocação. A sua origem está na Bíblia, sendo referido como um arcanjo, ou seja, um anjo da ordem mais alta na hierarquia celeste, aquele que liderou as forças do Senhor contra as hostes de Satanás. Não admira que seja invocado nas lutas do Bem contra o Mal.

Mas S. Miguel tem entre nós outra referência. Em 1962 foi construido na Noruega um navio de carga chamado “Sirefjell”, mais tarde comprado pela Sociedade Geral (Grupo CUF) e rebatizado como “Cabo Verde”; foi depois integrado em 1972 na Companhia Nacional de Navegação (CNN).

Na sequência do processo de extinção da CNN, nacionalizada em 1975, o “Cabo Verde” foi adquirido em 1986 pela Marinha, para ser utilizado como navio de apoio logístico, e foi novamente rebatizado, desta vez como “São Miguel”.

Os ingleses consideram que mudar o nome de um navio dá azar; e isso pode ser constatado na História, através dos nomes de navios capturados em guerras variadas, e que entraram ao serviço de Sua Magestade com estranhos nomes franceses, espanhóis ou outros.

Parece que com o nosso S.Miguel se passou algo relacionado. Não que deixasse de cumprir as suas missões, das quais se destaca a ajuda humanitária a Moçambique. Mas o seu fim foi muito complicado.

Esta referência tem a ver com uma tragédia que marcou profundamente os últimos dias: a terrífica explosão ocorrida em Beirute. Outras explosões de depósitos ou fábricas de munições ficaram na História, como a de um navio carregado de explosivos em Halifax, Canadá, em 1917, que provocou mais de dois mil mortos e a destruição parcial da cidade. Mas a de Beirute, por mais recente e seguida quase em direto, teve outro impacto.

Ao longo de muitos anos, o nosso Exército foi entesourando (é o termo talvez mais apropriado) toneladas de munições obsoletas nos paióis situados nos arredores da capital; foi o que se chamou a “cintura explosiva de Lisboa”. Acumular munições é problemático; acumular munições fora de prazo é suicidário.

Certo é que, com a tradicional inércia lusitana, lá se foram amontonado toneladas de alto explosivo com problemática segurança.

Até que, por iniciativa do comandante da Região Militar de Lisboa, se resolveu pôr cobro a esta situação Os três Ramos das Forças Armadas Portuguesas decidiram então, em 1994, carregar o “S. Miguel” com munições antigas e fora de prazo que estavam armazenadas em paióis da Marinha, Exército e Força Aérea, e afundá-lo no mar alto. No entanto, ao ser realizado o afundamento, por reação química ou por problemas de arrumação da carga, ocorreu uma enorme explosão, sentida a milhares de quilómetros de distância por detectores sísmicos. Não houve vítimas nem estragos em terra, mas não se ganhou para o susto.

Claro que houve logo quem tivesse tentado aproveitar o incidente para tramar o Comandante da Região Militar de Lisboa, à data um jovem militar graduado em oficial general para o desempenho do cargo. Mas, sendo este País dotado de bom senso Q.B., a coisa ficou por aí, tendo sido evitado o que poderia ser a repetição de Halifax em 1917, ou de Beirute em 2020.

O caso de Halifax deveu-se a uma colisão entre dois navios, o que desencadeou a explosão; o caso de Beirute deveu-se a negligência, que se prolongou por seis (!) anos, com a armazenamento de explosivos no centro de uma cidade portuária. Independentemente do que provocou a explosão (causa fortuita, por bomba ou projétil), nada justifica tal armazenamento.

Para se ter uma ideia, a explosão de 2,750 toneladas de nitrato de amónio pode ser superior em efeito à de uma arma nuclear tática, que pode ter uma poténcia inferior a uma quilotonelada (mil tonetadas de TNT), e podendo ser disparada por um obús de campanha.

É este o Mundo em que vivemos, à mercê de de aventureiros belicistas e de decisores políticos inconscientes e/ou corrruptos.

Que S. Miguel (o do Céu) nos acuda, nesta luta do Bem contra o Mal!

Para terminar, uma adivinha.

Quem foi o Comandante da Região Militar de Lisboa que contribuiu para evitar que Lisboa se pudesse transformar em Halifax ou Beirute?

Nuno Santa Clara

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