Home » Opinião

Paulo Dentinho na saída da direcção de Informação da RTP

19 de Outubro de 2018


Paulo Dentinho deixou hoje de ser director de Informação da RTP e despediu-se dos seus camaradas com um texto que reproduzimos aqui, seguido de um comentário de Ribeiro Cardoso.

Um agradecimento em forma de adeus

“A felicidade está por vezes oculta no desconhecido”
Victor Hugo

“Detesto despedidas mas, nesta altura em que cesso as funções de director de Informação, tenho de vos agradecer o apoio, a colaboração e a compreensão que recebi de quase todos vós, a honra que me deram ao terem partilhado comigo estes mais de três anos de Jornalismo.

Sinto orgulho em termos conseguido enfrentar muitos desafios e, em conjunto, ultrapassá-los. Usámos a liberdade e a responsabilidade, o espírito crítico e os valores (esses do nosso código deontológico e da nossa ética profissional – e sem isto não há Jornalismo) para trazer para a empresa claros sinais de respeitabilidade. Eles estão espelhados nos vários estudos, entre inquéritos e sondagens, onde se destaca inequivocamente a isenção e a independência da Informação da RTP como os sinais mais positivos do nosso Jornalismo.

Procurei ser um director de Informação num claro respeito por valores democráticos e humanistas. E independentemente das minhas opiniões pessoais, o jornalista que há em mim precedeu sempre essa dimensão. Nunca admiti arredondar cantos às notícias – os factos são sempre inquestionáveis.

Quanto à opinião, essa só pode ser livre e deve estar em liberdade no serviço público de televisão. Batalhei, por isso, para termos em antena a diversidade de pensamento da democracia portuguesa. A RTP não pode estar ao serviço de ninguém porque ao serviço de todos os portugueses.

É certo que cometi alguns erros e aquele que mais me custa é o de não ter conseguido para todos vós o que mereciam, o que merecem de resposta da empresa para a dignidade do vosso quotidiano. Mas nunca, nunca deixei de lutar por isso.

Pudesse eu e iria hoje ter convosco, um a um, uma a uma, para vos agradecer estes anos, iria abraçar todas aquelas e todos aqueles que se apreciam para lá do respeito profissional, e são muitos, são muitas. Mas, como disse, detesto despedidas. Partir ou ficar tem sempre algo de desconforto embora tenha também muito de esperança e aventura.

Deixo-vos o meu sonho de conseguir melhor Jornalismo.

Muito, muito obrigado.

Bem hajam todos. Bem hajam todas.

Paulo Dentinho

 

**********************

À luz deste caso: uma opinião sobre a RTP

Dentinho não foi, seguramente, um director perfeito – de resto não conheço nenhum. Mas, a meu ver, foi seguramente um director digno, sério, competente – o que de nem todos, longe disso, se pode dizer. Pôs o seu lugar à disposição da Administração depois da chuva de críticas causadas por um pequeno texto, privado, que publicou nas redes sociais, relativo ao caso Ronaldo. Isto é, dito de outro modo: por um delito de opinião foi criticado dentro e fora de portas, com um maestro escondido atrás do pano: o lobby do futebol. Ao qual quase todos se vergam, consciente ou inconscientemente.

Lamento a saída de Paulo Dentinho e sei, de ciência certa, que muito está por contar. Os lobbies, dentro e fora de casa continuarão, como sempre e para nossa vergonha colectiva, a mexer no caldeirão RTP com a maior naturalidade e à vontade. Incluindo, obviamente, os lobbies partidários. E eu a rebobinar os anos em que trabalhei na Televisão Pública e a ver agora, mesmo aqui à minha frente, a administração da RTP chefiada por Almerindo Marques, que alterou métodos habituais e combateu alguns interesses instalados na casa. Uma administração que, entre outros, integrava como vogal Gonçalo Reis e tinha como nº 2 Jorge Ponce de Leão, que também bateu com a porta. Como vão longe esses tempos. E como tudo continua como dantes, quartel general em Abrantes.

Vem agora aí Maria Flor Pedroso. Uma boa escolha, a meu ver. Jornalista experiente, pelo que dela conheço tem arcaboiço para pegar o boi pelos cornos. Mas, como dizem os cegos, vamos lá ver. Por mim, já me estou a rir e a imaginar a Flor, suando, a enfrentar ‘chicuelinas’ de vários matizes, vindas dos sítios menos esperados – e outras dos sítios normais… De fora e de dentro da casa. E já agora, tenho curiosidade em saber quem a vai acompanhar na direcção e o que vai mudar na informação da nossa TV pública. E acrescento: só espero e desejo que, como por norma se diz no interior da RTP ela não vá, mais dia, menos dia, parar à conhecida Unidade Interna de Queimados. Onde se encontra já Paulo Dentinho, embora mantenha no ar, pelo menos por enquanto, um programa de Debate com correspondentes estrangeiros.

E aqui chegado, lembro, a propósito, o texto “É urgente repensar o telejornal”, assinado por Nobre-Correia, Professor emérito de Informação e Comunicação da Université Libre de Bruxelles e autor do livro “Teoria da Informação Jornalística” (Almedina), que está aqui  a abrir o nosso site desde o passado dia 17. 

É um texto excelente, mas – desculpe lá , caro professor e amigo – com um pecadilho: Portugal, ao contrário do que muitos julgam, feliz ou infelizmente, ainda não é a Europa. Ou melhor: ainda está longe de uma certa Europa. Mas a RTP  tem que melhorar. E muito. Com rumo certo, com tempo e muita determinação. O diabo é que tal só poderá acontecer se muita outra coisa mudar em Portugal. É indispensável ter presente que há mais de quatro décadas somos (des)governados pelos mesmos de sempre.

Ribeiro Cardoso

Imprima esta página Imprima esta página

1 Comentário »

  • aires esteves said:

    Paulo Dentinho, não me pareceu que tivesse sido um bom diretor…

Comente esta notícia.

Escreva o seu comentário, ou linque para a notícia do seu site. Pode também subscrever os comentários subscrever comentários via RSS.

Agradecemos que o seu comentário esteja em consonância com o tema. Os comentários serão filtrados, antes de serem aprovados, apenas para evitar problemas relacionados com SPAM.