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“Expresso” Curto de 16 de agosto de 2018

16 de Agosto de 2018


“Verdades auto-evidentes” é uma expressão usada na famosa declaração de independência dos Estados Unidos. São verdades que são dadas como adquiridas, incontestáveis, incluindo as de que todos os homens são criados iguais e têm direito à vida, à liberdade e à procura da felicidade. Quinze anos depois desta declaração, em 1791, foi publicada a primeira emenda da Constituição americana, que prevê a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa.  (Pedro Santos Guerreiro)

Que, em 2018, centenas jornais se juntem publicando a mensagem de que “os jornalistas não são o inimigo” é bem sinal de como verdades que pareciam evidentes têm de afinal de ser reafirmadas e defendidas contra a propaganda política que deseja esvaziar o poder de quem a escrutina. É esse o título do editorial de hoje do “The Boston Globe”, a que se juntaram quase 350 jornais norte-americanos. Incluindo o “The New York Times”, que titula o seu editorial com a frase que inspira o título deste Expresso Curto: “Uma imprensa livre precisa de si”.

“Um pilar central da política do Presidente Trump é um assalto sustentado à imprensa livre”, escreve o Globe. Os jornalistas são considerados por Trump como “o inimigo do povo”, o que pode ter “consequências perigosas”: “Substituir uma imprensa livre por uma comunicação social controlada pelo Estado foi sempre um desejo primeiro para qualquer regime corrupto que tome o controlo de um país”. Trata-se de um editorial fortíssimo, quer no ataque aos ataques de Trump, quer na explicitação de que a imprensa não está a defender a sua própria corporação, mas os valores democráticos em que acredita e em cuja construção permanente participa.

O caso Trump revela o populismo levado ao extremo, mas muitos aprendizes de feiticeiro têm usado as mesmas armas para atiçar povos contra os jornalistas. “Criticar a Comunicação social – por subvalorizar ou sobrevalorizar histórias, por errarem – é inteiramente correto”, escreve o New York Times, “repórteres e editores são humanos e cometem erros. Corrigi-los é o centro do nosso trabalho. Mas insistir que verdades de que não se gosta são ‘notícias falsas’ é perigoso para a vida da democracia. E chamar jornalistas de ‘inimigo do povo’ é perigoso, ponto final”.

Usando as redes sociais como púlpitos de comícios globais, convencendo as pessoas de que a desintermediação as informa melhor – quando na verdade as manipula melhor -, amplificando erros de jornais, ateando ódios e criando perceções sobre mentiras, “factos alternativos” e “fake news”, políticos populistas têm o claro objetivo de aniquilar quem põe em causa o seu poder. Os jornalistas. Os editoriais de hoje marcam um movimento de força, de humildade perante os erros, de alerta e de apelo. Incluindo o apelo do New York Times de que assine jornais, para que os jornais sejam mais fortes, condição básica de independência e de capacidade de investimento em redações de investigação. Lá como cá. 

Cá é também por isso um bom dia para ler também o editorial escrito pela nova direção do Público, liderada pelo jornalista Manuel Carvalho, onde se defendem os grandes valores do jornalismo, como “os valores da livre iniciativa, da democracia liberal, das liberdades individuais, da fiscalização e controlo dos poderes”.

Todos os dias são bons dias para ler jornais. Democracias fortes têm e precisam de jornais fortes. As notícias põem em causa os poderes que mais as pretendem descredibilizar – e esta é outra verdade auto-evidente que não devia ser preciso escrever. Mas é. Lá como cá.

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