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O jornalismo dos “cidadãos comuns”

5 de Abril de 2015


Perceber os leitores é decisivo para a garantia de um elo que dá sentido e transparência a um jornal. (Paquete de Oliveira, Provedor do leitor do “Público”)

O jornalismo dos “cidadãos comuns”

No passado dia 28 de Março, um grupo de assíduos e colaborantes leitores de jornais, e que se agrupam sob a condição particular de serem habituais escritores de cartas para os jornais, promoveu, na Casa do Concelho de Tomar, em Lisboa, um encontro para reflectirem sobre esta simples pergunta: “Porque escrevem para os jornais.”

Respondendo ao convite que me foi dirigido, como provedor do Leitor do PÚBLICO, estive presente na qualidade de observador. Tanto quanto constatei, não se trata de uma organização formal, mas de um movimento espontâneo articulado através de redes sociais e com blogues editados, com a preocupação de dar uma resposta a compromissos que assumem de cidadania participativa. “Escrevemos — é uma das conclusões deste encontro — para, fundamentalmente, manifestar uma opinião com intenção cívica e política.” E acrescentam: “Quando as sociedades democráticas vivem as crises normais nas instituições que enformam a própria democracia, os meios de comunicação social são o último escape da liberdade das pessoas, derradeiro garante da palavra.”

Este grupo que reuniu uma vintena de cidadãos não se arroga o direito de representação do mais vasto número de cidadãos que, habitualmente ou ocasionalmente, enviam cartas para as direcções dos jornais. Mas pretende que esse grupo aumente, multiplique as suas redes de contacto e não desista de exercer uma participação activa que tem o carácter de um dever cívico. Escrever para os jornais, participar num fórum televisivo ou radiofónico — dizia um participante no encontro — é uma outra forma de ir para a rua protestar ou tomar parte numa manifestação. Reconhecem estes leitores a limitação de espaço que lhes está reservado por condicionamentos de planificação em custos e organização editorial, mas gostariam de ver esse “seu” espaço aumentado. Concordam que as suas cartas muitas vezes a exprimir um gesto espontâneo e reactivo se confrontam com os critérios editoriais que respeitam. Os assuntos sobre os quais escrevem nem sempre se enquadram numa actualidade das agendas mediáticas ou num jornal que, em estratégia de desenvolvimento, tenta a internacionalização por via online. Não negam a imperfeição formal que, certas vezes, marca a escrita destas suas cartas – mas rejeitam a “censura de gaveta” e, por isso, acham que este circuito deveria ser acarinhado pelos jornais numa interligação mais assídua com os seus autores.

Do debate que se prolongou todo o dia ficaram expressas ideias e opiniões que relevam um entendimento positivo de como deve ser preservado e cultivado este circuito entre cidadãos e media. Coloquei aspas na designação “cidadãos comuns”, pois sinceramente tenho algumas reticências sempre que invoco esta designação. Com efeito, comporta uma distinção real, entre autores/actores reconhecidos e anónimos, mas, porventura, é desvirtuosa, e até estigmatizante, no eficaz funcionamento de uma verdadeira democracia.

Creio ser correcto afirmar que a secção Cartas à Directora é um espaço que o PÚBLICO consagra com importância e algum relevo. Como provedor, confesso — talvez pelas minhas funções — que é a secção de que logo vou à procura. Perceber os leitores e, em especial, nas suas expressões de discordância, protesto, crítica, sugestão, é decisivo para a garantia de um elo que fortalece sentido e transparência a um jornal. E é, sobretudo, obrigação para um jornal que quer estar ao serviço de uma sociedade democrática.

CORREIO LEITORES/PROVEDOR

Erros e gralhas incompreensíveis

O processo de produção dos jornais tem hoje à sua disposição um enorme recurso a técnicas. Mas esse enriquecido recurso não pôs fim a uma “praga” que persegue os jornalistas. A “praga” das gralhas e dos erros. A produção do jornal digital, por exemplo, facilitou determinados procedimentos. Mas a velocidade que está associada a este processo, em certos casos, fez aumentar a contingência das gralhas e dos erros. Sendo sempre de evitar, há, todavia, casos verdadeiramente insuportáveis que tiram a paciência aos leitores. Foi o caso da composição de uma notícia sobre o co-piloto do terrível desastre, nos Alpes, do avião da companhia Germanwings, Andreas Lubitz, editada no PÚBLICO digital, de 29/03/2015, que mereceu do leitor José Frederico Soares um veemente protesto:

“Quatro parágrafos chegam para revelar o profundo estado de degradação a que chegou a redacção de textos na edição do PÚBLICO em linha. Estamos perante um amontoado de erros crassos, que provocam indignação, hilaridade e quase incompreensão do texto:

— na concordância sintáctica,

— na grafia de nomes próprios,

— na repetição tautológica,

— na ortografia,

— na escolha do léxico,

— na falta de pontuação obrigatória. (…)”

Deixo o protesto para que sirva de alerta. Penso poder evitar a transcrição do lastimável texto da notícia, lamentada e explicada pela própria directora do PÚBLICO, Bárbara Reis, nestes termos: “O leitor tem toda a razão. Foi um erro grave e já discutido com a equipa envolvida. Felizmente, o texto só esteve assim, tal como o leitor o leu no site, durante poucos minutos. Era uma notícia de última hora que estava a ser escrita no próprio site à medida que as novidades estavam a ser divulgadas. A nossa enorme falta de atenção gerou enorme embaraço. Só posso lamentar, pedir desculpa a todos os leitores que leram este esboço de notícia por editar e garantir que tudo faremos para que não volte a acontecer.”

Moscovici em Portugal e o PÚBLICO

A propósito da peça publicada no PÚBLICO (01/04/2015) sobre o encontro do  comissário europeu dos Assuntos Económicos e Financeiros, Pierre Moscovici, com os deputados e jornalistas, na Assembleia da República, o leitor Betânio de Almeida traz as seguintes interrogações:

“Moscovici vem a Portugal, vai à Assembleia de Portugal e está com deputados numa audição (!). O PÚBLICO dá notícia: página 18 (01/04/2015) com grande fotografia. O que perguntaram os deputados da oposição? Do PS? Como reagiram os deputados da oposição, nomeadamente do PS, ao que Moscovici disse?

Não se vislumbra: 90% do texto são afirmações do senhor Moscovici ou da Comissão. As afirmações de sempre… pensões, mercado do trabalho… E diz que é neutral!!!

Da parte dos deputados quase nada. Parece que o senhor jornalista também se refugia numa neutralidade duvidosa. O texto dá realce ao senhor, à mensagem de Moscovici. Ora o leitor gostaria de conhecer mais, atendendo a que Moscovici é militante do PS francês e seria uma boa oportunidade para o confrontar com contradições ideológicas. Ficamos na dúvida. Deputados passivos ou jornalista distraído?

Na minha opinião, este é um exemplo em que, para além da ausência da identidade própria de um jornal de referência, se alimenta um sentimento de frustração e perda de confiança no trabalho dos deputados e do jornalista. (…)”

Comentário: Pedi um comentário ao jornalista, Sérgio Anselmo Aníbal, autor do respectivo texto. Com particular humildade, digo eu, escreve o jornalista:

“Não sei muito bem que comentário fazer ao texto do leitor. Se calhar tem razão e não consegui espelhar muito bem o que se passou naquela comissão. Lendo agora, talvez devesse ter dado com mais detalhe o que foi dito pelos deputados. Parece-me também que o leitor, ao dizer que o jornalista “se refugia numa neutralidade duvidosa”, gostaria que eu tivesse sido mais opinativo sobre a neutralidade invocada pelo comissário. Penso que não seria o espaço para fazer opinião. E tenho a certeza que não me tentei colocar no texto do lado do comissário.”

José Manuel Paquete de Oliveira, Provedor do leitor do “Público”

“Público” 05 abril 2015

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