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A importância de (algumas) cartas ao director

14 de Julho de 2014


É uma simples carta de um leitor do “Público” à directora do jornal, mas, na sua singeleza, melhor do que muitos papers publicados em revistas científicas, ou bonitos quadros Excel carregados de dados económicos e financeiros, o seu conteúdo mostra eloquentemente como Portugal está ser destruído, nas suas entranhas, por esta gente que pensa que nos governa… (José Silva Pinto)

Sei bem que muitos acham que nada disto tem grande importância, pois o que é vital é tratar da dívida e do equilíbrio das contas públicas, que o resto virá por acréscimo.
Até pode ser que assim seja, mas, a manter-se o culto da Santa Austeridade que tem sido a norma, alguém pode garantir que a redução da dívida a 60 por cento do PIB será compatível com a existência de um país onde valha a pena viver?

Como acho que não há milagres — ou, a existirem, já devem estar todos feitos —, não me parece que isso seja possível. A carta do leitor Joaquim Tapadinhas, do Montijo, mostra isso mesmo: um país em vias de rápida destruição por esta governalha…

José Silva Pinto

A destruição do País

Infelizmente, os últimos governantes que têm dominado o nosso país, esbarraram na árvore e não vêem a floresta. Não levantam os olhos para ver que isto anda tudo ligado, e que uma decisão arrasta outras, e é, muitas vezes, um rastilho para destruir um lugar e continuar a despovoar o país.

Fecham a escola numa aldeia sem se aperceberem, que nalguns casos, o docente era o principal agente cultural do lugar, que organizava as actividades lúdicas e recreativas.

A modesta biblioteca da colectividade foi por si criada e até o pequeno grupo de teatro é ele que o ensaia e escolhe o repertório.

O posto dos CTT fecha porque já não há número suficiente de correio, quer enviado, quer recebido, pois livros, jornais, avisos e encomendas postais deixaram de circular.

A pequena papelaria, com o serviço Payshop, onde se pagava a luz, o telefone e a água, também encerrou, dado que o material escolar é agora adquirido na vila para onde os alunos foram transferidos. Para que a Junta não tomasse posição contra o encerramento da escola, pois o presidente era do Partido do Governo, criaram-se empregos, para o próprio e para um familiar, na condução da carrinha, adquirida para deslocar as crianças para o agrupamento escolar da sede do concelho. Desta trampolinice, o Ministério da Educação poupa o salário de um professor, e o Ministério da Administração Interna, acabará por pagar a mais dois funcionários. O professor deixou de morar no lugar e com ele foi a família que era uma referência local. A terra ficou mais pobre e não há quem ajude a esclarecer uma dúvida, do dia-a-dia, aos velhos moradores. Como remate final, até a Junta de Freguesia acabou e foi unida a outra, que fica a alguns quilómetros de distância. Assim se retiram as mínimas condições de sobrevivência a quem reside no interior do país. Uma sucessão de serviços públicos vão fechando nas vilas e concelhos menos povoados, arrastando consigo o encerramento de serviços privados, que deixam de ser rentáveis, tais como balcões bancários, EDP, TLP e outros. Primeiro fecharam maternidades e depois alguns hospitais, em que estas estiveram inseridas. Na ânsia da destruição, está decidido encerrar repartições de finanças de alguns concelhos. Na mesma senda, 20 tribunais serão extintos e 27 diminuídos nas suas funções. Por arrastamento, de tudo isto, resulta a fuga desses lugares de funcionários das mais diversas aptidões, médicos, enfermeiros, pessoal auxiliar, advogados, juízes, solicitadores, delegados do MP e todo o staff que nos lugares apropriados exerce a sua profissão.

Numa correlação com o atrás descrito, fecham restaurantes, cafés, todo o comércio onde esta gente se abastecia e que estava relacionado com as profissões, e as casas onde viveram e das quais têm recordações, ficarão, eternamente, para alugar porque o despovoamento é irreversível. Agora, os moradores têm de se deslocar para uma vila que comporta os serviços, às vezes a dezenas de quilómetros, dando origem a um aumento de combustível que importamos e que, no final, se soubessem fazer contas, veriam que tudo acaba por ser mais oneroso para a economia do país. Destroem o interior e arruínam a totalidade do país.

  Joaquim Carreira Tapadinhas,  Montijo

http://www.publico.pt/opiniao/noticia/cartas-a-directora-1662515

 

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